Plano de saúde pode negar exames de acompanhamento de gravidez?
A gravidez é um momento único na vida de uma mulher e requer cuidados médicos especiais para garantir a saúde da mãe e do bebê. Durante o período gestacional, é fundamental que a gestante realize uma série de exames de acompanhamento, que permitem o monitoramento da evolução da gravidez e a detecção precoce de possíveis complicações. No Brasil, as gestantes têm direito a acompanhamento médico adequado, incluindo exames de rotina, realizados em consulta com obstetras e em exames laboratoriais e de imagem. No entanto, a negativa de cobertura de planos de saúde para exames de acompanhamento de gravidez é uma realidade em alguns casos, gerando questionamentos sobre os direitos das mulheres nesse contexto.
Neste artigo, vamos abordar as questões relacionadas à negativa de exames de acompanhamento de gravidez pelos planos de saúde, explorando as obrigações das operadoras de saúde, os direitos das gestantes e as medidas legais que podem ser tomadas em caso de negativa.
O Que São Exames de Acompanhamento de Gravidez?
Os exames de acompanhamento de gravidez são uma série de testes realizados ao longo da gestação com o objetivo de monitorar a saúde da gestante e do bebê, identificar possíveis complicações e garantir que a gestação se desenvolva de forma saudável. Durante o período de gestação, a mulher passa por diversas mudanças no organismo, e esses exames são essenciais para detectar precocemente qualquer alteração que possa colocar em risco a saúde da mãe ou do feto.
Esses exames incluem tanto testes laboratoriais, como exames de sangue e urina, quanto exames de imagem, como ultrassonografias. Além disso, outros exames mais especializados, como exames genéticos ou de screening para doenças específicas, podem ser indicados dependendo do histórico médico da gestante ou de condições específicas da gravidez.
Tipos Comuns de Exames de Acompanhamento de Gravidez
A seguir, destacamos os principais exames realizados durante o acompanhamento de uma gravidez:
1. Ultrassonografia Obstétrica
A ultrassonografia é um dos exames mais importantes durante a gestação, pois permite visualizar o desenvolvimento do feto e identificar possíveis anomalias ou complicações, como a posição do bebê, a quantidade de líquido amniótico, o crescimento e o batimento cardíaco fetal. O exame é realizado várias vezes ao longo da gestação, sendo indicado pelo médico conforme necessário.
2. Exames de Sangue
Diversos exames de sangue são realizados durante a gestação para monitorar a saúde da mãe e do bebê. Alguns dos exames mais comuns incluem:
o Hemograma completo: para verificar níveis de hemoglobina e identificar possíveis sinais de anemia.
o Teste de glicose: utilizado para detectar a diabetes gestacional, uma condição que pode surgir durante a gravidez.
o Testes sorológicos: para identificar infecções como sífilis, toxoplasmose, rubéola e HIV.
o Grupo sanguíneo e fator Rh: para garantir que não haja incompatibilidade sanguínea entre a mãe e o bebê.
3. Exame de Urina
O exame de urina é realizado para detectar sinais de infecções urinárias ou outras condições que possam afetar a saúde da gestante, como a pré-eclâmpsia (hipertensão gestacional). Também é usado para verificar a presença de proteínas na urina, um possível indicativo de complicações.
4. Exame de Toxoplasmose e Outras Doenças Infecciosas
A toxoplasmose é uma infecção que pode ser transmitida pela ingestão de alimentos contaminados ou pelo contato com fezes de gatos. O exame sorológico verifica se a gestante já foi exposta ao parasita e pode ajudar a prevenir complicações para o bebê. Outros exames, como os para hepatite B, hepatite C e sífilis, também são importantes para proteger a saúde do bebê.
5. Exame de Glicose (Teste de Curva Glicêmica)
A realização do teste de glicose é essencial para detectar a diabetes gestacional, uma condição que ocorre quando o corpo da gestante não consegue produzir insulina suficiente durante a gravidez. A diabetes gestacional pode causar complicações tanto para a mãe quanto para o bebê se não for tratada adequadamente.
6. Exame de Urina para Proteínas
Este exame é importante para identificar sinais precoces de pré-eclâmpsia, uma condição que envolve hipertensão arterial e aumento da quantidade de proteínas na urina da gestante. A pré-eclâmpsia pode afetar gravemente a saúde da mãe e do bebê, e a detecção precoce é crucial para o tratamento.
7. Exames de Triagem Genética
Durante a gestação, pode ser indicado o teste de triagem genética, que pode incluir o teste de translucência nucal, a medição de marcadores sanguíneos ou a amniocentese (em casos específicos). Esses exames são usados para avaliar o risco de o bebê ter condições genéticas, como síndrome de Down, síndrome de Edwards ou síndrome de Patau.
8. Monitoramento da Pressão Arterial
A pressão arterial é monitorada durante todo o pré-natal, pois a hipertensão pode ser um indicativo de pré-eclâmpsia ou outras complicações graves. O controle da pressão arterial da gestante é essencial para prevenir complicações durante a gravidez e o parto.
9. Exame de Ultrassonografia Morfológica
A ultrassonografia morfológica é um exame realizado entre a 18ª e a 24ª semana de gestação, sendo um dos mais completos, pois permite visualizar o desenvolvimento anatômico do bebê. Ele avalia o crescimento e a formação de órgãos, ossos e tecidos, e pode detectar anomalias no feto, como problemas cardíacos ou malformações.
10. Exame de Monitorização Fetal
A monitorização fetal é um exame feito nas últimas semanas da gestação para avaliar o bem-estar do bebê. Esse exame pode incluir a cardiotocografia, que monitora os batimentos cardíacos do bebê e a contração uterina, ajudando a identificar sinais de sofrimento fetal.
A Importância dos Exames de Acompanhamento na Gravidez
Os exames de acompanhamento durante a gestação são essenciais por diversas razões:
• Detecção Precoce de Complicações: Muitos problemas podem ser detectados antes que se tornem graves, como a diabetes gestacional, a hipertensão e a pré-eclâmpsia. O monitoramento constante permite que o médico recomende tratamentos precoces para evitar complicações mais sérias para a mãe e o bebê.
• Garantia do Desenvolvimento Saudável do Bebê: O acompanhamento através da ultrassonografia, por exemplo, permite verificar o crescimento e o desenvolvimento do feto, ajudando a garantir que o bebê esteja se desenvolvendo corretamente e sem anomalias.
• Planejamento de Parto Seguro: A realização de exames como a ultrassonografia morfológica permite que o médico planeje o parto, considerando possíveis complicações, como o tamanho do bebê ou a posição fetal, o que pode determinar a necessidade de um parto cesariano ou de intervenções durante o parto normal.
• Monitoramento do Bem-Estar da Gestante: A gestante também precisa ser monitorada durante a gravidez, principalmente para identificar sinais de hipertensão, anemia ou infecções urinárias, que podem ter impacto negativo na saúde da mãe e do bebê.
A Legislação Brasileira e o Direito da Gestante a Exames de Acompanhamento
No Brasil, a legislação assegura aos pacientes, incluindo as gestantes, uma série de direitos em relação ao acesso à saúde, incluindo a cobertura de exames essenciais para o acompanhamento da gravidez. A garantia desses direitos é uma das bases do Sistema Único de Saúde (SUS) e também é aplicada aos planos de saúde, que devem respeitar a legislação para assegurar que a gestante tenha acesso aos cuidados necessários durante o pré-natal.
A seguir, vamos explorar a legislação que regula os direitos das gestantes no que tange aos exames de acompanhamento durante a gravidez.
1. A Constituição Federal de 1988
A Constituição Federal de 1988 é a principal norma que assegura os direitos fundamentais dos cidadãos no Brasil. Ela garante, no Artigo 196, que "a saúde é direito de todos e dever do Estado", estabelecendo a responsabilidade do Estado em fornecer cuidados médicos e serviços de saúde à população. Além disso, a Constituição determina que a saúde seja universal e igualitária, ou seja, todos devem ter acesso à assistência à saúde sem discriminação.
Esse princípio é a base de outros direitos garantidos às gestantes, que têm a saúde garantida como um direito fundamental. Portanto, os serviços de saúde, incluindo os exames de acompanhamento durante a gestação, devem ser disponibilizados para as gestantes, seja pelo SUS ou pelos planos privados de saúde.
2. Lei dos Planos de Saúde (Lei nº 9.656/98)
A Lei nº 9.656, de 3 de junho de 1998, regula os planos e seguros privados de assistência à saúde no Brasil. Esta lei estabelece os direitos dos beneficiários de planos de saúde, determinando as coberturas obrigatórias e as condições para a prestação de serviços médicos. De acordo com a Lei nº 9.656, os planos de saúde são obrigados a cobrir exames de acompanhamento de gestantes, incluindo aqueles necessários para garantir a saúde da mãe e do bebê.
Artigo 12 da Lei nº 9.656/98: Este artigo descreve os procedimentos e exames obrigatórios que devem ser cobertos pelos planos de saúde. Entre os exames obrigatórios estão os relacionados ao acompanhamento da gravidez, como ultrassonografia, exames de sangue, de urina e outros que sejam necessários para monitorar a saúde da gestante e do feto.
Além disso, a Lei nº 9.656/98 garante o direito à cobertura integral do pré-natal, incluindo os exames de rotina e de urgência, sem imposição de carência para gestantes que entram para o plano de saúde, desde que estejam dentro do período de carência de outros serviços, conforme estabelecido no contrato.
3. Resoluções da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS)
A ANS é o órgão responsável por regulamentar os planos de saúde no Brasil e garantir que as operadoras de planos de saúde cumpram as normas estabelecidas pela legislação. A ANS emite resoluções que detalham as coberturas obrigatórias e as condições de atendimento a serem seguidas pelas operadoras.
De acordo com as resoluções da ANS, os planos de saúde são obrigados a cobrir todos os exames de acompanhamento durante a gestação, como exames de imagem, laboratoriais, e outros necessários para o acompanhamento da saúde da gestante e do feto. Além disso, a ANS determina que, em caso de emergência ou urgência relacionada à gestação, o plano de saúde não pode negar cobertura, sob pena de incorrer em infração.
Resolução Normativa nº 428/2017: Esta resolução estabelece o rol de procedimentos obrigatórios dos planos de saúde, incluindo o acompanhamento completo do pré-natal e todos os exames que garantem a saúde da gestante e do bebê.
4. O Código de Defesa do Consumidor (CDC)
O Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990) também é uma importante ferramenta para garantir os direitos das gestantes, principalmente no que se refere à relação com os planos de saúde, que são considerados fornecedores de serviços. O CDC assegura que os consumidores tenham acesso a serviços adequados, e no caso dos planos de saúde, assegura que a cobertura contratada seja cumprida integralmente.
Artigo 6º do CDC: Este artigo estabelece os direitos básicos dos consumidores, entre os quais estão a proteção à vida, à saúde e à segurança, e a defesa contra práticas abusivas. No caso dos planos de saúde, isso significa que as operadoras não podem negar a cobertura de exames e tratamentos essenciais à saúde, como o acompanhamento da gravidez.
O Artigo 51 do CDC, por sua vez, define como abusivas as cláusulas contratuais que colocam em desvantagem o consumidor, sendo que a negativa de cobertura de exames essenciais para a saúde da gestante pode ser considerada uma prática abusiva. Caso o plano de saúde negue exames de acompanhamento de gravidez, a gestante pode recorrer ao Procon ou ao Judiciário para garantir seus direitos.
5. O Sistema Único de Saúde (SUS)
Além dos planos privados de saúde, o Sistema Único de Saúde (SUS) é uma das principais fontes de atendimento para as gestantes no Brasil. O SUS garante a realização dos exames de acompanhamento de gravidez, incluindo as consultas, exames laboratoriais, ultrassonografias, entre outros.
A Lei nº 8.080/1990, que regulamenta o SUS, assegura que a saúde seja acessível a todos os cidadãos, sem custo para a gestante, independentemente de sua condição financeira. O SUS oferece, de maneira integral, os exames necessários para o acompanhamento da gestação, e a gestante tem direito a esses serviços durante todo o período pré-natal e até o pós-parto.
6. Direitos da Gestante e Garantias de Atendimento
A legislação brasileira assegura que a gestante tenha direito a cuidados médicos durante toda a gestação, incluindo os exames de acompanhamento. Caso um plano de saúde negue a cobertura de exames de acompanhamento de gravidez, a gestante pode recorrer ao Ministério Público, à ANS ou à Defensoria Pública para garantir que seus direitos sejam respeitados. Além disso, é possível entrar com uma ação judicial para obrigar o plano de saúde a realizar os exames necessários.
Em caso de urgência ou emergência, a negativa de cobertura para exames de acompanhamento de gravidez, como ultrassonografias essenciais ou exames laboratoriais, pode ser considerada uma infração grave, que coloca em risco a vida da gestante e do bebê. Nesses casos, a negativa de cobertura pode ser tratada como um erro grave, passível de multa e de reparação por danos materiais e morais.
Razões Comuns para a Negativa de Exames de Acompanhamento de Gravidez
Apesar da obrigatoriedade de cobertura dos exames de acompanhamento de gravidez, os planos de saúde, em algumas situações, tentam negar a realização desses procedimentos. As razões mais comuns para a negativa incluem:
1. Exames Não Cobertos no Rol de Procedimentos Obrigatórios
O rol de procedimentos obrigatórios definidos pela ANS inclui uma lista de exames e tratamentos que os planos de saúde devem cobrir, mas algumas operadoras tentam argumentar que determinados exames não estão incluídos nesse rol. Isso pode ocorrer, por exemplo, com exames mais específicos ou de maior custo, como algumas formas de ultrassonografia ou testes genéticos.
2. Limitação de Consultas e Exames
Alguns planos de saúde impõem limites no número de consultas e exames que podem ser realizados ao longo da gravidez, mesmo que o médico responsável recomende mais exames devido a fatores de risco ou complicações na gestação. A negativa pode ocorrer com base em cláusulas contratuais que restringem a cobertura de exames.
3. Justificativas Médicas Questionáveis
Em alguns casos, os planos de saúde negam exames alegando que a gestante não apresenta risco para complicações e que os exames solicitados são desnecessários. No entanto, essa justificativa não leva em consideração a recomendação do médico, que é quem deve determinar a necessidade de exames com base nas condições de saúde da gestante e do bebê.
4. Exames de Caráter Experimental ou Fora do Protocolo
Alguns exames que não fazem parte do protocolo padrão de acompanhamento de gestação, mas que podem ser necessários em casos específicos, como exames genéticos, podem ser negados com a justificativa de que são experimentais ou não obrigatórios. Essa alegação pode gerar confusão, pois existem situações em que tais exames são recomendados para a prevenção de doenças ou para o diagnóstico precoce de condições graves.
Direitos da Gestante em Caso de Negativa de Exame de Acompanhamento
Quando o plano de saúde nega a cobertura de exames de acompanhamento de gravidez, a gestante tem uma série de direitos assegurados pela legislação brasileira e pela Agência Nacional de Saúde Suplementar. Entre os principais direitos, podemos destacar:
1. Direito ao Acesso Universal à Saúde
A Constituição Federal garante que a saúde é um direito universal e dever do Estado. O artigo 196 da Constituição assegura que todos têm direito a serviços de saúde, independentemente da condição financeira ou do tipo de plano de saúde. Além disso, a saúde da mulher durante a gravidez é tratada como uma prioridade, o que inclui a cobertura de exames essenciais.
2. Cobertura de Exames de Acompanhamento no Pré-Natal
De acordo com a Lei nº 9.656/1998 e as resoluções da ANS, os planos de saúde são obrigados a cobrir os exames realizados durante o pré-natal. Caso haja negativa, a gestante pode recorrer à ANS ou ao judiciário para garantir que os exames sejam realizados sem custo adicional.
3. Ação Judicial para Garantir os Direitos
Em caso de negativa de cobertura, a gestante pode recorrer à justiça para exigir que o plano de saúde cumpra suas obrigações. A jurisprudência brasileira tem reconhecido a obrigatoriedade de cobertura dos exames de acompanhamento de gravidez e, quando necessário, a justiça pode determinar a realização do exame, inclusive com a possibilidade de solicitar o reembolso dos custos, caso a gestante tenha pago o exame por conta própria.
4. Denúncia à ANS e aos Órgãos de Defesa do Consumidor
Caso o plano de saúde se recuse a fornecer o atendimento ou o exame, a gestante pode denunciar a operadora à ANS ou ao Procon (órgão de defesa do consumidor). A ANS possui canais de ouvidoria para que o consumidor registre sua reclamação e tenha suas questões resolvidas.
Como Proceder em Caso de Negativa?
Diante de uma negativa de cobertura de exames de acompanhamento de gravidez, a gestante deve:
1. Solicitar uma justificativa por escrito para a negativa, com explicações claras e fundamentadas.
2. Entrar em contato com a ANS para registrar a queixa, uma vez que a agência tem o poder de fiscalizar e intervir em situações de descumprimento das normas.
3. Buscar orientação jurídica, caso necessário, para entender quais são as opções legais disponíveis.
4. Recorrer ao judiciário para garantir que o plano de saúde forneça os exames necessários, com base nas recomendações médicas.
Conclusão
A negativa de exames de acompanhamento de gravidez pelos planos de saúde é uma violação dos direitos das gestantes, que têm garantido em lei o acesso a cuidados médicos adequados e exames necessários durante o período gestacional. As gestantes devem estar cientes dos seus direitos e das obrigações dos planos de saúde, buscando orientação jurídica e acionando os órgãos competentes caso haja recusa. A legislação brasileira assegura a prioridade da saúde da mulher e da criança, tornando impossível que planos de saúde se eximam de fornecer os exames imprescindíveis para o acompanhamento da gravidez.


