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Plano de Saúde Pode Negar Cobertura de Medicamentos de Uso Contínuo?

A negativa de cobertura de medicamentos por parte dos planos de saúde é uma situação recorrente, especialmente quando se trata de medicamentos de uso contínuo, aqueles necessários para o tratamento de doenças crônicas ou de longo prazo. O acesso a esses medicamentos é essencial para garantir a qualidade de vida dos pacientes, e a negativa de cobertura por parte dos planos de saúde levanta questões jurídicas e de direitos do consumidor. Neste artigo, abordaremos a questão da negativa de cobertura de medicamentos de uso contínuo pelos planos de saúde, explicando os direitos dos pacientes, a legislação brasileira e as possibilidades de recurso.

O Que São Medicamentos de Uso Contínuo?

Medicamentos de uso contínuo são aqueles que precisam ser administrados regularmente, geralmente por um período prolongado, para o controle ou tratamento de condições crônicas ou de longo prazo. Ao contrário dos medicamentos que são utilizados para tratar doenças agudas ou temporárias, os medicamentos de uso contínuo são essenciais para o manejo de doenças que não têm cura, mas que podem ser controladas ou mantidas sob controle com o uso constante de medicamentos.

Esses medicamentos são prescritos para uma ampla gama de doenças e condições, incluindo, mas não se limitando a:

1. Doenças crônicas não transmissíveis: Como hipertensão (pressão alta), diabetes tipo 1 e 2, doenças cardíacas, artrite reumatoide, entre outras. O uso regular de medicamentos é necessário para prevenir complicações graves, como infartos, derrames e danos aos órgãos vitais.

2. Doenças autoimunes: Pacientes com doenças como lúpus, esclerose múltipla ou artrite psoriática frequentemente necessitam de medicamentos imunossupressores ou anti-inflamatórios de uso contínuo para controlar a progressão da doença.

3. Transtornos psiquiátricos: Pessoas com condições como depressão crônica, transtorno bipolar, esquizofrenia e transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) podem precisar de antidepressivos, estabilizadores de humor ou antipsicóticos em doses contínuas para evitar recaídas.

4. Distúrbios endócrinos: Pacientes com distúrbios hormonais, como hipotireoidismo ou síndrome de Cushing, dependem de medicamentos para regular a produção de hormônios e manter os níveis adequados no corpo.

O uso contínuo desses medicamentos é crucial para evitar a deterioração da saúde do paciente e melhorar a sua qualidade de vida. O tratamento contínuo também pode ajudar a reduzir os sintomas e prevenir complicações mais sérias da doença, muitas vezes evitando hospitalizações e outras intervenções mais invasivas.

Porém, o custo de alguns desses medicamentos pode ser elevado, especialmente para doenças raras ou condições que exigem medicamentos inovadores. Esse fator pode levar a desafios para os pacientes, principalmente quando há negativas de cobertura por parte dos planos de saúde.

O Direito à Cobertura de Medicamentos de Uso Contínuo

No Brasil, o direito à cobertura de medicamentos de uso contínuo está garantido pela legislação que rege os planos de saúde, com ênfase na proteção da saúde do paciente e na prestação de cuidados médicos adequados, incluindo o fornecimento de medicamentos necessários para o tratamento de doenças crônicas e condições de longo prazo. Este direito é respaldado por uma série de normas e decisões judiciais que visam garantir que os pacientes tenham acesso ao tratamento contínuo de que necessitam, sem que sejam prejudicados por limitações impostas pelos planos de saúde.

1. A Legislação Brasileira e os Medicamentos de Uso Contínuo

A Lei dos Planos de Saúde (Lei nº 9.656/1998) estabelece uma série de obrigações para os planos de saúde, incluindo a cobertura de medicamentos essenciais para o tratamento de doenças que comprometem a saúde do paciente de forma contínua. De acordo com essa legislação, os planos de saúde devem cobrir uma gama de procedimentos médicos e tratamentos, sendo uma das principais obrigações a cobertura de medicamentos que são necessários para o controle de doenças crônicas.

Em 2013, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) criou a Resolução Normativa nº 428, que especifica os procedimentos e medicamentos obrigatórios para os planos de saúde, incluindo a cobertura para tratamentos de doenças crônicas e medicamentos de uso contínuo. A resolução define claramente que os planos de saúde são obrigados a fornecer medicamentos essenciais para o tratamento de doenças que não têm cura, mas que podem ser controladas com o uso contínuo de medicamentos. Isso inclui, por exemplo, medicamentos para doenças como hipertensão, diabetes, doenças cardiovasculares, doenças autoimunes, entre outras.

2. Cobertura de Medicamentos no Rol de Procedimentos da ANS

O rol de procedimentos e eventos em saúde da ANS é um documento que lista os tratamentos, exames e medicamentos que os planos de saúde são obrigados a cobrir. Essa lista é atualizada periodicamente, com base nas diretrizes científicas e nas necessidades de saúde da população. Embora a inclusão de medicamentos de uso contínuo no rol de procedimentos dependa de sua relevância terapêutica e eficácia comprovada, é importante destacar que a ANS garante a cobertura dos medicamentos que sejam considerados indispensáveis para o controle de doenças crônicas.

Além disso, a ANS estabelece que, em caso de necessidade de tratamento para uma condição que não seja prevista no rol, os planos de saúde devem cobrir medicamentos que sejam essenciais e que tenham indicação médica clara, com base em sua eficácia e necessidade para o paciente.

3. O Impacto das Decisões Judiciais

Mesmo que a legislação estabeleça a cobertura de medicamentos de uso contínuo, é comum que pacientes enfrentem dificuldades ao solicitar a cobertura desses medicamentos por parte dos planos de saúde. Muitas vezes, os planos de saúde negam a cobertura, alegando que os medicamentos não estão no rol da ANS ou questionando sua relevância para o tratamento. Nesses casos, a legislação brasileira prevê que os pacientes têm o direito de recorrer judicialmente para garantir o fornecimento dos medicamentos.

As decisões judiciais têm sido favoráveis à cobertura de medicamentos de uso contínuo, considerando o direito à saúde como um direito fundamental, conforme disposto na Constituição Federal de 1988, que garante a todos os cidadãos o direito ao acesso à saúde de forma integral e equânime. Nos tribunais, a interpretação tem sido de que, mesmo que um medicamento não esteja explicitamente no rol da ANS, ele deve ser fornecido se houver recomendação médica clara de que o tratamento é essencial para o controle de uma doença crônica e que sua omissão poderia prejudicar a saúde do paciente.

Além disso, a Lei nº 13.455/2017 reforça a obrigatoriedade dos planos de saúde de cobrir medicamentos prescritos de forma contínua, especialmente quando há um laudo médico que comprove a necessidade do tratamento. Essa lei foi um marco na ampliação da cobertura, tratando de questões específicas como o fornecimento de medicamentos para pacientes com doenças graves ou condições que exigem tratamentos contínuos.

Medicamentos Essenciais e a Obrigação de Cobertura

A ANS determina que os planos de saúde devem cobrir medicamentos essenciais para o tratamento de doenças listadas no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde, que é uma lista de tratamentos e procedimentos que os planos de saúde devem cobrir obrigatoriamente. No caso dos medicamentos de uso contínuo, a cobertura depende do tipo de plano contratado, mas, de forma geral, os medicamentos que são considerados essenciais para o tratamento de doenças graves ou crônicas devem ser fornecidos.

Embora os planos de saúde possam alegar que certos medicamentos não estão cobertos pelo rol da ANS, é importante destacar que, em casos excepcionais, os planos têm a obrigação de cobrir medicamentos que são essenciais para o tratamento de doenças graves, mesmo que esses medicamentos não estejam explicitamente mencionados no rol da ANS. Nesse caso, a justificativa do plano de saúde para a negativa deve ser claramente fundamentada, e o paciente pode contestar essa negativa por meio de ações legais.

Razões Comuns para a Negativa de Cobertura de Medicamentos de Uso Contínuo

Existem várias razões pelas quais os planos de saúde podem tentar negar a cobertura de medicamentos de uso contínuo. Algumas das razões mais comuns incluem:

1. Medicamento Não Está no Rol da ANS

Uma das alegações mais comuns por parte dos planos de saúde é que o medicamento não está incluído no rol da ANS, o que, em princípio, poderia justificar a negativa de cobertura. No entanto, é importante destacar que essa justificativa não é absoluta. O rol de procedimentos da ANS define os tratamentos e medicamentos que devem ser cobertos pelos planos de saúde, mas em situações excepcionais, o plano de saúde deve garantir a cobertura de medicamentos que sejam essenciais para o tratamento do paciente, mesmo que não estejam no rol da ANS.

2. Medicamento de Alto Custo

Outro motivo para a negativa de cobertura de medicamentos de uso contínuo é o alto custo do medicamento. Muitos medicamentos de uso contínuo, especialmente no caso de tratamentos para doenças raras ou graves, têm preços elevados, o que pode levar os planos de saúde a tentar negar a cobertura com base no custo. Nesse caso, o paciente pode recorrer à justiça, pois o plano de saúde tem a obrigação de garantir o tratamento adequado, independentemente do custo envolvido.

3. Interpretação Restritiva do Contrato

Os planos de saúde também podem tentar negar a cobertura de medicamentos de uso contínuo alegando que o medicamento não se enquadra nas condições previstas no contrato. No entanto, essa interpretação restritiva do contrato é contestável, uma vez que a legislação brasileira garante que o plano de saúde deve cobrir medicamentos essenciais para o tratamento de doenças graves ou crônicas, mesmo que esses medicamentos não estejam explicitamente mencionados no contrato.

4. Medicamento Substituto ou Similar

Em alguns casos, o plano de saúde pode tentar negar a cobertura do medicamento original, oferecendo um medicamento substituto ou similar. O paciente tem o direito de recusar a substituição, especialmente se o medicamento indicado pelo médico for considerado essencial para o tratamento. Nesse caso, a negativa do plano pode ser considerada indevida, e o paciente pode buscar a cobertura do medicamento original por meio de recurso judicial.

5. Medicamento Não Prescrito pelo Médico do Plano

Alguns planos de saúde podem alegar que o medicamento não é coberto porque não foi prescrito por um médico credenciado pelo plano. Embora os planos de saúde possam exigir que o paciente consulte um médico credenciado para determinadas situações, o medicamento prescrito por um médico de confiança do paciente deve ser coberto, especialmente se for essencial para o tratamento da condição.

Como Recorrer de Uma Negativa de Cobertura de Medicamentos?

Recorrer de uma negativa de cobertura de medicamentos por parte de um plano de saúde exige um processo detalhado para garantir que os direitos do paciente sejam respeitados. Aqui estão os principais passos a seguir:

1. Verifique a Justificativa da Negativa

O primeiro passo é entender claramente o motivo da negativa. O plano de saúde deve fornecer uma explicação escrita sobre o motivo pelo qual o medicamento não será coberto. Certifique-se de que a negativa está bem fundamentada e se ela está em conformidade com as cláusulas do contrato do plano e com a legislação vigente.

2. Reúna a Documentação Necessária

Para contestar a negativa, é essencial reunir todos os documentos médicos relevantes, incluindo:

• Prescrição médica detalhada, com justificativa para o uso do medicamento.

• Laudos médicos que comprovem a necessidade do tratamento.

• Relatórios de especialistas que atestem a gravidade da condição do paciente e a eficácia do medicamento solicitado.

3. Solicite uma Revisão Interna

Antes de recorrer à Justiça, é possível solicitar uma revisão interna do caso diretamente ao plano de saúde. Isso deve ser feito por meio de uma formalização, como um recurso administrativo. O prazo para a resposta a esse pedido deve ser verificado no contrato do plano, mas, geralmente, a operadora tem 10 a 30 dias úteis para se manifestar.

4. Protocole uma Reclamação na ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar)

Se a revisão interna não resultar em um resultado favorável, é possível registrar uma reclamação na ANS. A ANS pode intervir para mediar a solução do conflito entre o beneficiário e o plano de saúde. A agência tem o poder de aplicar multas às operadoras que descumprirem as normas de cobertura.

5. Ação Judicial

Caso todas as tentativas administrativas falhem, o paciente pode recorrer à via judicial. Nesse caso, o processo envolve:

• Petição inicial: Um advogado especializado em direito à saúde irá ajuizar uma ação para garantir a cobertura do medicamento.

• Medida liminar: O juiz pode conceder uma decisão urgente para que o plano de saúde forneça o medicamento enquanto o processo tramita.

• Provas médicas: O advogado irá apresentar toda a documentação necessária para comprovar a urgência e a necessidade do tratamento.

6. Possibilidade de Indenização por Danos Morais

Em casos em que a negativa do plano de saúde cause prejuízos à saúde do paciente, além da cobertura do medicamento, também pode ser solicitada uma indenização por danos morais, devido ao sofrimento causado pela recusa.

7. Acompanhamento do Caso

Após o ajuizamento da ação, o paciente e o advogado devem acompanhar o andamento do processo. Caso a decisão judicial seja favorável, o plano de saúde será obrigado a fornecer o medicamento, sob pena de multas ou outras penalidades.

Conclusão

Os planos de saúde têm a obrigação legal de cobrir medicamentos essenciais, incluindo os de uso contínuo, para o tratamento de doenças crônicas e graves. A negativa de cobertura desses medicamentos pode ser contestada judicialmente, pois fere os direitos do paciente à saúde e à vida. Os pacientes que enfrentam a negativa de cobertura de medicamentos de uso contínuo devem buscar orientação jurídica e recorrer aos órgãos competentes, como a ANS, para garantir que seus direitos sejam respeitados.