Plano de Saúde Pode Negar Cirurgia de Emergência?
A cobertura de procedimentos médicos, especialmente cirurgias de emergência, é um tema central na relação entre beneficiários e planos de saúde no Brasil. Quando uma cirurgia de emergência é necessária para a sobrevivência ou o bem-estar de um paciente, a negativa de cobertura por parte de um plano de saúde pode ser um grande desafio. No entanto, a legislação brasileira estabelece claramente os direitos dos pacientes e as obrigações das operadoras de planos de saúde, visando assegurar que os indivíduos recebam o tratamento necessário sem impedimentos. Neste artigo, exploraremos a questão da negativa de cobertura de cirurgias de emergência pelos planos de saúde, analisando o que diz a legislação, a jurisprudência e as possíveis soluções legais para garantir o acesso aos tratamentos necessários.
1. O que é uma Cirurgia de Emergência?
A cirurgia de emergência é uma intervenção médica realizada em situações nas quais o paciente apresenta uma condição crítica que exige uma ação imediata para preservar sua vida, funcionalidade de órgãos vitais ou para evitar complicações graves. Essas cirurgias não podem ser planejadas com antecedência e exigem uma resposta rápida, muitas vezes sem a possibilidade de esperar pela autorização de um plano de saúde ou por outros trâmites burocráticos.
Em muitos casos, a cirurgia de emergência é a única opção viável para garantir a sobrevivência do paciente ou minimizar danos irreversíveis à saúde. A decisão de realizar a cirurgia é geralmente tomada por médicos especialistas com base no quadro clínico do paciente, sendo de suma importância para evitar que a situação se agrave ou leve a uma situação irreversível.
Exemplos Comuns de Cirurgias de Emergência:
• Apendicite Aguda: Quando o apêndice do paciente se inflama, ele pode romper e causar infecção generalizada (peritonite), o que coloca a vida em risco. Nesses casos, é necessário realizar uma apendicectomia imediatamente.
• Trauma Crânioencefálico: Em casos de acidentes que resultam em traumatismos na cabeça, pode ser necessária uma cirurgia de emergência para retirar coágulos sanguíneos ou reparar danos cerebrais, com o objetivo de evitar danos cerebrais permanentes ou morte.
• Acidente Vascular Cerebral (AVC): Quando ocorre um AVC isquêmico (por obstrução de um vaso sanguíneo) ou hemorrágico (ruptura de um vaso), a remoção do coágulo ou a drenagem do sangue acumulado pode ser necessária para minimizar o dano cerebral e evitar sequelas graves.
• Fraturas Compostas: Em acidentes, fraturas ósseas que penetram a pele (fraturas expostas) ou que comprometem a função de órgãos próximos, como no caso de fraturas de fêmur com comprometimento vascular, exigem uma abordagem cirúrgica urgente para restaurar a função e evitar complicações como infecção e sangramentos.
• Obstrução Intestinal: Quando o intestino se bloqueia, impedindo a passagem dos alimentos ou fluidos, a condição pode levar a necrose e septicemia. A cirurgia de emergência é necessária para desobstruir o intestino e remover qualquer parte danificada.
• Hemorragias Internas: Pacientes que sofrem grandes perdas de sangue, como no caso de acidentes ou condições médicas (úlcera perfurada, ruptura de aneurisma), necessitam de intervenções cirúrgicas imediatas para estancar o sangramento e prevenir choque hemorrágico.
Características da Cirurgia de Emergência:
1. Urgência e Imediatismo: A principal característica de uma cirurgia de emergência é a necessidade de agir rapidamente. O tempo é um fator crítico, e a intervenção não pode ser adiada, sob risco de complicações irreversíveis ou até morte.
2. Avaliação Médica Rápida: A decisão de realizar a cirurgia é tomada com base na avaliação médica feita de forma rápida e eficiente. Os médicos geralmente agem de acordo com os sinais clínicos mais evidentes, priorizando a preservação da vida.
3. Falta de Planejamento Prévio: Ao contrário das cirurgias eletivas, que podem ser programadas com antecedência, as cirurgias de emergência não são planejadas. Elas surgem como resposta a situações imprevistas e inesperadas, como acidentes, doenças agudas ou complicações de outras condições médicas.
4. Risco Imediato à Vida: A cirurgia de emergência é geralmente realizada quando há risco iminente de morte ou de danos irreversíveis à saúde do paciente, caso a intervenção não aconteça rapidamente.
5. Diversidade de Especialidades: Cirurgias de emergência podem envolver uma ampla gama de especialidades médicas, incluindo cirurgia geral, neurocirurgia, ortopedia, cardiologia, ginecologia, entre outras, dependendo da natureza da emergência.
A Importância da Cirurgia de Emergência no Contexto dos Planos de Saúde
A legislação brasileira é clara ao afirmar que cirurgias de emergência devem ser cobertas pelos planos de saúde. De acordo com a Lei nº 9.656/98, que regulamenta os planos e seguros privados de saúde, a cobertura de urgência e emergência é obrigatória, independentemente de o procedimento estar especificado no contrato do plano de saúde. Isso significa que os planos não podem negar cobertura para uma cirurgia de emergência, mesmo que ela não esteja explicitamente prevista no rol de procedimentos ou se houver controvérsia sobre a necessidade do tratamento.
Essa cobertura é crucial, pois uma negativa de cobertura para um procedimento de emergência pode resultar em danos irreparáveis ao paciente, incluindo morte ou sequelas permanentes. Portanto, a legislação busca proteger o direito à vida e à saúde, garantindo que os planos de saúde ofereçam cobertura integral para situações de urgência e emergência.
2. O Direito à Cobertura de Cirurgia de Emergência
No Brasil, os direitos à saúde estão assegurados pela Constituição Federal de 1988, sendo uma das prioridades do Estado, conforme disposto no art. 196 da Carta Magna, que afirma: "A saúde é direito de todos e dever do Estado". Este princípio se reflete na legislação infraconstitucional, incluindo a Lei nº 9.656/98, que regulamenta os planos e seguros privados de saúde. Ela determina que os planos de saúde devem oferecer cobertura para uma série de serviços, incluindo procedimentos de emergência.
Em caso de cirurgia de emergência, a legislação brasileira garante que os planos de saúde não podem se eximir de oferecer a cobertura necessária. Essas cirurgias, que envolvem situações clínicas críticas e com risco imediato à vida, são consideradas urgentes e, portanto, devem ser atendidas independentemente da cláusula contratual ou da previsão do rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
2.1. A Lei dos Planos de Saúde
A Lei nº 9.656/98 estabelece que a cobertura de urgências e emergências é obrigatória para os planos de saúde, incluindo as cirurgias que possam ser necessárias para salvar a vida ou minimizar danos à saúde do paciente. O rol de procedimentos da ANS, que lista os tratamentos que os planos de saúde devem cobrir, não exclui a necessidade de cobertura para casos emergenciais. Mesmo que o procedimento não esteja especificamente listado, se ele for necessário para salvar a vida ou preservar a saúde do paciente, o plano de saúde é obrigado a cobri-lo.
De acordo com a legislação, emergência é definida como uma situação que apresenta risco imediato para a saúde do paciente, e urgência é um caso que pode ser tratado em um curto espaço de tempo, mas não apresenta risco imediato. Embora a legislação seja mais detalhada para definir esses dois tipos de situações, ela é clara ao afirmar que ambas as situações devem ser cobertas pelos planos de saúde.
2.2. O Rol de Procedimentos da ANS e a Cobertura de Cirurgia de Emergência
A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) é a entidade responsável por regulamentar os planos de saúde no Brasil. A ANS tem o papel de definir o rol de procedimentos, que estabelece os serviços de saúde que os planos de saúde devem oferecer aos seus beneficiários. No entanto, é importante frisar que emergências médicas são cobertas independentemente do rol da ANS. Isso significa que, mesmo que uma cirurgia de emergência não esteja especificamente incluída no rol, ela deve ser realizada e custeada pelo plano, se for necessária para preservar a vida ou a saúde do paciente.
Portanto, ao se tratar de uma situação de emergência, a cobertura é garantida por lei, sem qualquer tipo de restrição do rol de procedimentos da ANS. Mesmo que o plano de saúde não ofereça a cobertura para o procedimento específico, emergências sempre devem ser cobertas, pois o risco à vida é uma questão prioritária.
2.3. A Natureza Urgente das Cirurgias de Emergência
Uma cirurgia de emergência pode ser exigida em uma série de situações, como aquelas que envolvem traumatismos, infecções graves, acidente vascular cerebral (AVC), infarto do miocárdio, ruptura de órgãos ou hemorragias. Nesses casos, a necessidade de um procedimento cirúrgico imediato é crucial para evitar danos irreversíveis à saúde do paciente, como sequelas graves, deficiência permanente ou até a morte.
A demora na realização da cirurgia pode piorar o quadro do paciente, agravar a condição médica e até inviabilizar o tratamento de recuperação. Como essas cirurgias envolvem risco imediato à vida ou à saúde, elas têm um caráter urgente e imprescindível para que a situação seja controlada e o paciente possa ter suas condições estabilizadas.
2.4. A Negativa do Plano de Saúde e Seus Efeitos
Quando um plano de saúde nega a cobertura de uma cirurgia de emergência, ele está descumprindo a legislação brasileira que garante o direito à saúde e à assistência médica integral. Tal negativa pode ser considerada abuso por parte da operadora, visto que ela está colocando em risco a vida e a saúde do paciente. Em casos de negativa, é possível que o paciente recorra à justiça, exigindo a cobertura do procedimento médico emergencial.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem reforçado a ideia de que os planos de saúde não podem recusar tratamentos médicos de emergência sob alegação de que o procedimento não está previsto no contrato ou no rol da ANS. O entendimento dos tribunais é claro: emergências devem ser atendidas prontamente, e os planos de saúde devem arcar com os custos necessários para preservar a saúde e a vida do paciente.
2.5. Como Agir Caso o Plano de Saúde Negue a Cobertura
Se o plano de saúde negar a cobertura de uma cirurgia de emergência, o paciente ou seus familiares devem tomar algumas providências:
1. Buscar o Atendimento Médico: A primeira medida é garantir que o atendimento médico seja realizado, independentemente da negativa do plano. Em situações de emergência, o atendimento deve ser prestado imediatamente.
2. Registrar a Negativa: É importante que o paciente ou seus familiares solicitem por escrito a negativa da cobertura, caso haja algum documento ou comunicação formal do plano de saúde. Isso pode ser importante para embasar um futuro processo judicial.
3. Contatar a ANS: A ANS atua como órgão regulador dos planos de saúde, e o paciente pode formalizar uma reclamação junto à agência, relatando a negativa do plano e solicitando que a ANS tome as providências necessárias para garantir o direito à cobertura.
4. Buscar Assistência Jurídica: Em muitos casos, a negativa de cobertura de uma cirurgia de emergência pode ser contestada judicialmente. O paciente tem o direito de buscar a justiça para garantir o acesso ao tratamento necessário. A decisão judicial pode determinar que o plano de saúde arque com os custos da cirurgia de emergência, além de aplicar multas ou outras penalidades em caso de descumprimento.
2.6. Consequências Legais para os Planos de Saúde
A negativa de cobertura de uma cirurgia de emergência pode ter diversas consequências legais para os planos de saúde. Caso a negativa seja considerada abusiva, o plano pode ser obrigado judicialmente a cobrir o tratamento, além de ser responsabilizado pelo dano moral causado ao paciente, considerando a situação de risco à saúde e o sofrimento emocional.
Além disso, o plano de saúde pode ser multado pela ANS caso se recuse a fornecer cobertura para tratamentos emergenciais, uma vez que está descumprindo a legislação que garante o direito à saúde da população.
3. Razões para a Negativa de Cobertura de Cirurgia de Emergência
Apesar das disposições legais, planos de saúde podem, por vezes, tentar negar a cobertura de cirurgias de emergência. As razões para a negativa podem variar, mas algumas das justificativas mais comuns incluem:
3.1. Falta de Autorização Prévia
Muitas operadoras de planos de saúde exigem autorização prévia para procedimentos de alta complexidade, incluindo algumas cirurgias. No entanto, em situações de emergência, a solicitação de autorização pode ser impossível devido à urgência da intervenção. Nesse caso, a exigência de autorização prévia para uma cirurgia de emergência pode ser considerada abusiva, uma vez que a lei prevê que procedimentos de urgência e emergência devem ser realizados sem a necessidade de autorização prévia.
3.2. Condições Contratuais
Alguns planos de saúde podem argumentar que a cirurgia não está coberta pelo contrato. Isso pode ocorrer em casos de cirurgias muito específicas ou menos comuns. No entanto, essa justificativa não é válida para cirurgias de emergência, pois, de acordo com a legislação, qualquer procedimento necessário para a manutenção da vida e da saúde do paciente deve ser coberto, independentemente de estar explicitamente listado no contrato.
3.3. Classificação Indevida da Urgência
Em alguns casos, a operadora pode tentar reclassificar a emergência como uma condição não urgente, alegando que a cirurgia não é imprescindível no momento. Isso pode ocorrer, por exemplo, em casos em que a avaliação inicial do médico é considerada insuficiente, ou em que o plano de saúde questiona a necessidade da cirurgia. No entanto, esse tipo de reclassificação pode ser considerado uma tentativa de negação indevida, pois a decisão sobre a urgência e a necessidade do procedimento deve ser tomada pelo médico assistente e não pela operadora de saúde.
4. O Que Fazer em Caso de Negativa de Cobertura de Cirurgia de Emergência?
Quando um plano de saúde nega a cobertura de uma cirurgia de emergência, o paciente pode tomar diversas medidas para garantir seus direitos. A seguir, detalhamos as ações que o beneficiário pode tomar:
4.1. Procurar a Central de Atendimento do Plano de Saúde
O primeiro passo deve ser entrar em contato com a central de atendimento do plano de saúde para esclarecer as razões da negativa. Muitas vezes, o problema pode ser resolvido rapidamente, como um erro administrativo ou falta de comunicação. Nessa etapa, é importante pedir por escrito a justificativa da negativa, para que o paciente tenha um registro formal da recusa.
4.2. Acionar a ANS
Se a questão não for resolvida pela central de atendimento, o paciente pode denunciar a operadora à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que é o órgão responsável pela fiscalização dos planos de saúde no Brasil. A ANS pode intervir para garantir que a operadora cumpra as obrigações legais, incluindo a cobertura de cirurgias de emergência.
4.3. Buscar Orientação Jurídica
Se a negativa persistir, o paciente pode consultar um advogado especializado em direito da saúde. Através da assessoria jurídica, o paciente pode avaliar as opções legais para garantir a cobertura do procedimento. O advogado pode orientar sobre como buscar uma liminar judicial para garantir a realização da cirurgia o mais rápido possível, especialmente em situações de risco iminente à saúde.
4.4. Ação Judicial
Em situações extremas, em que a cirurgia de emergência é essencial para a saúde do paciente e não há alternativa para resolver a negativa administrativamente, o paciente pode recorrer ao Judiciário para garantir a cobertura da cirurgia. O juiz pode conceder uma liminar, determinando que o plano de saúde cubra imediatamente o procedimento, independentemente de qualquer formalidade contratual ou administrativa.
5. A Jurisprudência sobre Negativa de Cirurgia de Emergência
A jurisprudência dos tribunais superiores tem se mostrado favorável aos direitos dos pacientes quando se trata de cirurgias de emergência. Os tribunais, como o Superior Tribunal de Justiça (STJ), têm consistentemente decidido que a negativa de cobertura para procedimentos urgentes é ilegal e abusiva, baseando-se no princípio da dignidade da pessoa humana e no direito à saúde garantido pela Constituição.
Em diversas decisões, o STJ tem reiterado que os planos de saúde não podem negar procedimentos que envolvem risco imediato à saúde do paciente, como cirurgias de emergência. O entendimento é de que, diante de uma emergência, a prioridade é a saúde do paciente, e não se pode permitir que questões contratuais ou administrativas interfiram no tratamento necessário.
6. Conclusão
Em resumo, a negativa de cobertura de cirurgia de emergência por parte de planos de saúde é ilegal e configura uma violação dos direitos do paciente. De acordo com a legislação brasileira, todos os planos de saúde devem garantir a cobertura de procedimentos de urgência, incluindo cirurgias de emergência, independentemente de questões contratuais ou administrativas. Caso um plano de saúde se recuse a cobrir uma cirurgia de emergência, o paciente tem o direito de buscar a via administrativa ou judicial para garantir que o procedimento seja realizado sem demora, assegurando sua saúde e bem-estar.


