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O Plano de Saúde Pode Negar Internação Psiquiátrica?

A saúde mental é um aspecto fundamental do bem-estar humano e, quando se trata de tratamentos psiquiátricos, a cobertura dos planos de saúde é frequentemente um tema de preocupação. Uma das questões mais comuns é a negativa de internação psiquiátrica por parte dos planos de saúde. Este tipo de negativa gera não apenas dificuldades para os pacientes, mas também para as famílias, que muitas vezes se deparam com uma situação de extrema urgência e precisam lidar com a burocracia das operadoras de saúde.

Diante disso, é importante compreender os direitos dos pacientes, as obrigações das operadoras de plano de saúde e a legislação brasileira sobre a cobertura de tratamentos psiquiátricos. Neste artigo, exploraremos se os planos de saúde podem ou não negar a cobertura de internação psiquiátrica, as razões mais comuns para essa recusa e o que pode ser feito pelos pacientes diante de uma negativa.

1. O Que é Internação Psiquiátrica?

A internação psiquiátrica é um procedimento de tratamento especializado para pacientes que apresentam transtornos mentais graves e que necessitam de cuidados intensivos e acompanhamento contínuo. Ela pode ocorrer em unidades de saúde, como hospitais psiquiátricos ou clínicas de saúde mental, que oferecem um ambiente estruturado e adequado para o tratamento e monitoramento de condições psiquiátricas.

Esse tipo de internação é necessário quando o paciente encontra-se em uma crise psiquiátrica, onde sua condição mental compromete de forma significativa a sua saúde ou coloca em risco a sua vida ou a de outros. Em muitos casos, a internação psiquiátrica visa proporcionar o tratamento adequado, a estabilização do paciente e, em última instância, a sua reintegração ao ambiente social, familiar e profissional.

Tipos de Internação Psiquiátrica

A internação psiquiátrica pode ser classificada em diferentes tipos, de acordo com o quadro clínico do paciente e a necessidade do tratamento:

• Internação Voluntária: O paciente, ou seus familiares, solicita a internação de forma voluntária. Essa modalidade é indicada para pacientes que reconhecem a necessidade de tratamento e concordam com a hospitalização para receber cuidados especializados.

• Internação Involuntária: Quando o paciente não possui condições para decidir sobre o tratamento, seja devido à gravidade da doença ou à perda da capacidade de julgamento, e a internação é realizada sem o seu consentimento. Nesse caso, é necessário que um responsável legal ou familiar assine a autorização para a internação. A internação involuntária é regida por normas legais rigorosas e requer a avaliação de um médico para garantir que a medida seja adequada e necessária.

• Internação Compulsória: A internação compulsória ocorre em situações excepcionais, quando o paciente apresenta risco iminente de morte ou de prejudicar a si mesmo ou a outras pessoas. Ela é determinada judicialmente e exige uma avaliação médica e, em alguns casos, a intervenção do Ministério Público ou da Justiça.

Indicações para Internação Psiquiátrica

A internação psiquiátrica pode ser indicada em diversos cenários, como:

• Transtornos Psicóticos: Como a esquizofrenia, onde o paciente apresenta alterações graves na percepção da realidade, podendo ter delírios, alucinações e comportamentos agressivos ou desorganizados.

• Transtornos de Humor: Como a depressão maior e o transtorno bipolar, que podem levar o paciente a um estado de risco iminente, seja por suicídio ou por comportamento descontrolado.

• Transtornos de Ansiedade Grave: Quando a pessoa sofre com crises de pânico constantes ou outros transtornos que comprometem sua qualidade de vida e funcionamento diário.

• Transtornos Alimentares: Como a anorexia nervosa e bulimia, que podem comprometer a saúde física e mental do paciente, necessitando de acompanhamento psiquiátrico especializado.

• Dependência Química: No caso de abuso de substâncias psicoativas, como álcool ou drogas ilícitas, quando o paciente necessita de cuidados intensivos e desintoxicação.

Objetivo da Internação Psiquiátrica

O objetivo principal da internação psiquiátrica é proporcionar ao paciente um ambiente seguro e controlado, onde ele possa receber a avaliação e tratamento adequados. O tratamento pode incluir:

• Medicamentos psiquiátricos para estabilização do quadro clínico.

• Psicoterapia individual ou em grupo.

• Acompanhamento constante por médicos psiquiatras, psicólogos e outros profissionais de saúde.

A internação também visa monitorar o comportamento do paciente, oferecer apoio emocional e permitir que ele se recupere em um ambiente que minimize riscos de autoagressão, suicídio ou agressão a outros.

Duração da Internação Psiquiátrica

A duração da internação psiquiátrica depende do quadro clínico do paciente e do progresso do tratamento. Não há um tempo fixo, e a alta hospitalar é determinada com base em uma avaliação médica. Alguns pacientes podem necessitar de internamentos prolongados, enquanto outros podem se recuperar em um curto período. A alta médica só ocorre quando o paciente está estável e apto a continuar o tratamento ambulatorial ou domiciliar.

Em casos de crises agudas, a internação pode ser breve, enquanto em transtornos mais complexos ou com complicações associadas, como a dependência química, a internação pode ser necessária por mais tempo.

2. A Legislação Brasileira e os Direitos dos Pacientes em Relação à Internação Psiquiátrica

A internação psiquiátrica no Brasil é regida por uma série de normas e leis que buscam assegurar os direitos dos pacientes enquanto garantem a qualidade do atendimento, o respeito à dignidade humana e o cumprimento das exigências de tratamento adequado. A legislação brasileira, especialmente no que tange ao tratamento psiquiátrico, busca equilibrar a necessidade de proteção do paciente com sua autonomia, reconhecendo as especificidades e complexidades do tratamento de transtornos mentais.

A seguir, discutimos as principais legislações que garantem os direitos dos pacientes durante a internação psiquiátrica:

1. Constituição Federal de 1988

A Constituição Federal estabelece os direitos fundamentais de todos os cidadãos, incluindo os pacientes psiquiátricos. Em seu artigo 5º, ela assegura a dignidade da pessoa humana e o direito à vida, à liberdade, à igualdade e à segurança. Esses princípios são essenciais para o tratamento dos pacientes em qualquer contexto, incluindo a internação psiquiátrica, e garantem que:

• O tratamento psiquiátrico deve ser realizado sem violência e com respeito à integridade física e psicológica dos pacientes.

• Os pacientes têm direito a ser informados sobre o tratamento e a participar de decisões sobre sua saúde sempre que possível.

Além disso, a Constituição também garante, no artigo 196, o direito à saúde para todos os cidadãos, o que inclui o direito ao acesso a tratamentos psiquiátricos adequados.

2. Lei nº 10.216/2001 - Lei de Reforma Psiquiátrica

A Lei nº 10.216, de 2001, é um marco fundamental para os direitos dos pacientes em internação psiquiátrica e na reforma do sistema de saúde mental no Brasil. Ela busca garantir os direitos humanos das pessoas com transtornos mentais, promovendo uma mudança significativa no modelo de tratamento e substituindo a abordagem de internação prolongada por um modelo mais humanizado e comunitário.

A Lei nº 10.216 define os seguintes direitos para os pacientes psiquiátricos:

• Direito à liberdade e à dignidade: O paciente psiquiátrico tem direito à liberdade e à dignidade humana, sendo tratado de forma respeitosa, e a internação só pode ocorrer em casos de necessidade médica.

• **Direito à informação: O paciente tem direito a ser informado sobre seu diagnóstico e tratamento, com a explicação clara de todos os procedimentos.

• Tratamento em Ambiente Menos Restritivo: A Lei estabelece que o tratamento deve ser realizado preferencialmente em ambientes menos restritivos, com a internação sendo indicada apenas quando necessária, e deve ser temporalmente limitada.

• Acompanhamento e tratamento em ambulatório: Para pacientes que não necessitam de internação, a lei incentiva o acompanhamento psiquiátrico ambulatorial, com a utilização de serviços de saúde mental na comunidade.

• Direito ao consentimento: O paciente tem o direito de dar consentimento informado para a internação psiquiátrica. A internação involuntária ou compulsória só é permitida em situações excepcionais e deve ser sempre avaliada por um médico.

• Direito ao tratamento em instituições que atendam aos padrões de qualidade e ética, conforme as exigências dos conselhos de classe e normas de vigilância sanitária.

Essa legislação é um dos pilares para humanizar o tratamento de pessoas com transtornos mentais e garantir que sua liberdade individual e dignidade sejam respeitadas.

3. Lei nº 13.146/2015 - Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência)

Embora não trate exclusivamente de pacientes psiquiátricos, a Lei nº 13.146, de 2015, também influencia diretamente os direitos dos pacientes internados para tratamento psiquiátrico, uma vez que ela assegura a inclusão das pessoas com deficiência no âmbito da sociedade.

Entre os principais direitos assegurados pela Lei Brasileira de Inclusão, destacam-se:

• Direitos à igualdade de tratamento e à não discriminação: Pacientes psiquiátricos têm direito a ser tratados de forma igualitária, sem sofrerem discriminação em razão de sua condição mental.

• Direito ao atendimento especializado e adaptado: A lei reforça a necessidade de que os pacientes com transtornos psiquiátricos recebam atendimento especializado, considerando suas necessidades específicas.

• Acesso a serviços e programas de reabilitação: A pessoa com transtornos mentais tem direito a ser inserida em programas de reabilitação, quando necessário, com o objetivo de reintegração social e autonomia.

Essa legislação, combinada com a Lei nº 10.216/2001, representa um avanço importante na construção de uma sociedade mais inclusiva e no reconhecimento das pessoas com transtornos psiquiátricos como cidadãs com todos os direitos garantidos.

4. Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990)

O Código de Defesa do Consumidor (CDC) também protege os pacientes em situações de internação psiquiátrica. De acordo com a legislação brasileira, o paciente que contrata um plano de saúde tem direito à cobertura de tratamentos médicos necessários, inclusive internação psiquiátrica, quando indicada por um profissional de saúde.

O artigo 6º do CDC estabelece que o consumidor tem direito à informação adequada e clara sobre os serviços contratados, enquanto o artigo 14 trata da responsabilidade dos fornecedores de serviços, incluindo os planos de saúde, por danos causados pela negativa de cobertura ou pela má prestação de serviços.

No contexto da internação psiquiátrica, se o plano de saúde negar cobertura para a internação de um paciente, o consumidor pode recorrer ao judiciário, exigindo a cobertura do tratamento e a reparação por danos causados pela negativa indevida.

5. A Lei de Saúde Mental e o Sistema Único de Saúde (SUS)

O Sistema Único de Saúde (SUS) também está envolvido na regulação da assistência psiquiátrica, garantindo acesso ao tratamento para todos os cidadãos, independentemente de sua condição social ou econômica. O SUS tem a obrigação de fornecer tratamento psiquiátrico, inclusive internação quando necessário, através de unidades especializadas, como hospitais psiquiátricos, centros de atenção psicossocial (CAPS) e hospitais gerais com serviços de saúde mental.

Em caso de negativa de atendimento pelo plano de saúde, os pacientes também podem buscar o atendimento pelo SUS, que deve garantir o atendimento adequado, conforme os preceitos da Lei nº 10.216/2001.

3. O Plano de Saúde Pode Negar Internação Psiquiátrica?

Apesar das leis que garantem a cobertura de tratamentos psiquiátricos, muitos pacientes se deparam com a negativa de internação psiquiátrica por parte das operadoras de planos de saúde. Quando isso ocorre, é importante entender o que a legislação e a regulamentação da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) dizem sobre o tema e os motivos pelos quais a negativa pode ser indevida.

Cobertura Obrigatória

De acordo com a legislação vigente, os planos de saúde devem garantir a cobertura de tratamentos psiquiátricos, incluindo a internação psiquiátrica, se o tratamento for necessário para a preservação da vida e do bem-estar do paciente. Isso se aplica a qualquer tipo de internação psiquiátrica, seja em regime de emergência ou programada, desde que o tratamento esteja relacionado a uma doença mental grave, conforme previsto no Rol de Procedimentos da ANS.

Portanto, os planos de saúde não podem negar a cobertura de internação psiquiátrica para pacientes que necessitam desse tipo de tratamento, principalmente em casos de emergência.

Situações de Negativa Indevida

Existem alguns motivos que, embora válidos em outros contextos, não são aceitos como justificativa para a negativa de internação psiquiátrica, tais como:

• Limitações de prazo: O plano de saúde não pode limitar o número de dias de internação, especialmente quando se trata de internação em situações de emergência. O paciente deve ser internado pelo tempo necessário ao tratamento.

• Exclusões no contrato: Embora os planos de saúde possam excluir coberturas para tratamentos estéticos, procedimentos eletivos ou experimentais, a internação psiquiátrica não pode ser excluída, pois ela está diretamente relacionada à preservação da saúde do paciente e é prevista pela legislação.

• Motivos financeiros ou de conveniência: A recusa de cobertura por questões financeiras ou administrativas também é considerada ilegal. O plano de saúde não pode se eximir de fornecer o tratamento por questões de custo ou por falta de leitos em unidades conveniadas.

Urgência e Emergência

No contexto da internação psiquiátrica, as situações de urgência ou emergência não podem ser negadas. A lei determina que, em casos de risco iminente à vida do paciente ou quando este se encontra em estado de crise psiquiátrica grave, o plano de saúde deve cobrir a internação imediatamente, sem que haja a necessidade de autorização prévia ou intervenção burocrática.

4. O Que Fazer em Caso de Negativa de Internação Psiquiátrica?

Se um paciente ou seus familiares se depararem com a negativa de internação psiquiátrica, existem algumas medidas que podem ser tomadas para garantir que os direitos do paciente sejam respeitados.

Procurar a ANS

A primeira medida é registrar uma queixa na ANS, que é o órgão responsável pela regulação dos planos de saúde no Brasil. A ANS pode intervir nas questões relacionadas ao descumprimento das normas pelos planos de saúde e buscar uma solução para o problema.

Ação Judicial

Caso a negativa persista, o paciente pode entrar com uma ação judicial para garantir a cobertura do tratamento. O Poder Judiciário tem se mostrado favorável ao direito do paciente à saúde, e muitos pacientes têm obtido decisões favoráveis determinando que o plano de saúde arque com a internação psiquiátrica, mesmo em situações de urgência.

Assistência de um Advogado Especializado

É fundamental contar com a assistência de um advogado especializado em direito à saúde, que poderá orientá-lo sobre os melhores passos a serem tomados, seja para recorrer à ANS ou ingressar com uma ação judicial.

5. Conclusão

A internação psiquiátrica é um direito fundamental para aqueles que necessitam de tratamento especializado para doenças mentais graves. A legislação brasileira assegura que os planos de saúde não podem negar a cobertura de internação psiquiátrica, especialmente quando se trata de emergência ou tratamento essencial para a preservação da vida e saúde do paciente.

Se ocorrer a negativa, o paciente tem o direito de buscar a intervenção da ANS ou recorrer ao Judiciário para garantir a cobertura necessária. A proteção legal do paciente é clara, e qualquer recusa indevida pode resultar em consequências legais para as operadoras de plano de saúde.

Por fim, é fundamental que os pacientes e seus familiares conheçam seus direitos e saibam como agir caso se deparem com a negativa de cobertura para internação psiquiátrica. A legislação brasileira assegura a saúde mental como um direito, e os pacientes devem ser protegidos em sua busca por tratamento adequado.