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Negativa de Tratamento para Doenças Raras: Quais São os Meus Direitos?

As doenças raras são aquelas que afetam um número reduzido de pessoas, geralmente menos de 1 a cada 2.000 indivíduos. Apesar de sua raridade, essas condições podem ser extremamente graves, debilitantes e, muitas vezes, fatais. O tratamento de doenças raras exige uma abordagem médica especializada e, frequentemente, o uso de medicamentos ou terapias de alto custo, que nem sempre são acessíveis aos pacientes. Quando um plano de saúde nega a cobertura de um tratamento para uma doença rara, surge a dúvida sobre quais direitos o paciente tem e como proceder para garantir que seus direitos sejam respeitados.

Neste artigo, vamos abordar o que caracteriza uma doença rara, quais são os direitos dos pacientes nesses casos e o que pode ser feito quando um plano de saúde se recusa a fornecer o tratamento necessário.

1. O Que São Doenças Raras?

As doenças raras, também conhecidas como doenças órfãs, são aquelas que afetam um número muito pequeno de pessoas em comparação com a população geral. A definição exata pode variar de acordo com o país, mas, de maneira geral, uma doença é considerada rara quando afeta menos de 1 a cada 2.000 pessoas.

Embora as doenças raras sejam, por definição, pouco comuns, elas englobam uma ampla variedade de condições médicas, que podem ser de origem genética, autoimune, infecciosa ou neurológica. Algumas dessas doenças são extremamente graves e debilitantes, afetando a qualidade de vida dos pacientes de maneira significativa. Em alguns casos, elas podem ser fatais, especialmente se não forem diagnosticadas e tratadas de maneira adequada.

A característica comum entre as doenças raras é a dificuldade de diagnóstico e tratamento, muitas vezes devido à falta de conhecimento da comunidade médica sobre a condição ou pela escassez de pesquisas voltadas para essas doenças. Além disso, o tratamento dessas condições frequentemente exige medicamentos ou terapias especializadas, que podem ser de alto custo e nem sempre estão disponíveis no mercado ou no Sistema Único de Saúde (SUS).

Em termos de números, existem mais de 7.000 doenças raras identificadas, e estima-se que essas doenças afetem cerca de 8% da população mundial, ou aproximadamente 400 milhões de pessoas em todo o planeta. Contudo, devido à sua raridade, o impacto direto de cada uma delas é muito menor, o que faz com que muitos desses pacientes enfrenten grandes desafios para receber o diagnóstico e o tratamento adequado.

Alguns exemplos de doenças raras incluem:

• Fibrose Cística: Uma doença genética que afeta os pulmões, o pâncreas e outros órgãos, causando dificuldade respiratória e problemas digestivos.

• Doença de Huntington: Uma condição neurodegenerativa que causa movimentos involuntários, alterações cognitivas e problemas de comportamento.

• Síndrome de Ehlers-Danlos: Um grupo de distúrbios que afetam o tecido conjuntivo, resultando em pele excessivamente elástica, articulações instáveis e facilidade para contusões.

• Atrofia Muscular Espinhal (AME): Uma doença genética que afeta os neurônios motores, resultando em fraqueza muscular progressiva.

• Doenças raras oncológicas: Como os tipos raros de câncer, que não são frequentemente diagnosticados ou tratados devido à sua raridade.

A maioria das doenças raras tem origem genética, o que significa que elas podem ser herdadas dos pais ou ocorrer devido a mutações genéticas espontâneas. Embora algumas dessas doenças possam ser diagnosticadas ainda na infância, outras só se manifestam na vida adulta.

A grande maioria das doenças raras não possui cura conhecida. O tratamento, portanto, é frequentemente direcionado para alívio dos sintomas e melhora da qualidade de vida, utilizando medicamentos específicos ou terapias inovadoras. No entanto, devido à natureza especializada desses tratamentos, o acesso a eles nem sempre é fácil ou garantido, especialmente quando se trata de medicamentos de alto custo ou terapias experimentais.

Dado o impacto significativo das doenças raras na vida dos pacientes e suas famílias, é essencial que políticas públicas de saúde, tanto no Sistema Único de Saúde (SUS) quanto nos planos de saúde privados, garantam o acesso ao diagnóstico adequado e ao tratamento necessário para essas condições, buscando assegurar que os direitos dos pacientes sejam respeitados.

2. Direitos dos Pacientes com Doenças Raras no Sistema de Saúde Brasileiro

Os pacientes diagnosticados com doenças raras no Brasil têm direito a uma série de garantias previstas pela legislação nacional. Essas condições exigem cuidados específicos, e o sistema de saúde do país, tanto o Sistema Único de Saúde (SUS) quanto os planos de saúde privados, têm obrigações legais para assegurar o acesso a tratamentos, medicamentos e terapias inovadoras. No entanto, devido às características únicas dessas doenças e ao alto custo de muitos tratamentos, é comum que os pacientes se depararem com dificuldades em acessar o atendimento necessário.

A legislação brasileira garante que pacientes com doenças raras tenham acesso a serviços de saúde adequados, independentemente de a condição ser rara ou não. Vamos explorar os principais direitos dos pacientes com doenças raras, de acordo com a legislação brasileira.

2.1. A Lei dos Planos de Saúde: Lei nº 9.656/1998

A Lei nº 9.656/1998, que regula os planos de saúde privados no Brasil, é uma das principais legislações que garante a cobertura para pacientes com doenças raras. Essa lei estabelece que as operadoras de planos de saúde devem cobrir uma ampla gama de tratamentos e procedimentos médicos, incluindo os relativos a doenças raras, desde que estes sejam considerados necessários e estejam indicados por um médico.

Cobertura de Medicamentos de Alto Custo e Terapias Inovadoras

A Resolução Normativa nº 433/2018 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) foi um marco importante, pois determinou que os planos de saúde devem cobrir tratamentos e medicamentos de alto custo necessários para o tratamento de doenças raras. Isso inclui medicamentos que não estão no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS, mas que são essenciais para o tratamento da condição do paciente.

A ANS também garante que os planos de saúde forneçam terapias inovadoras para doenças raras, mesmo que esses tratamentos sejam novos, caros e ainda não tenham uma ampla comprovação de eficácia. Dessa forma, se o médico prescrever um tratamento que seja considerado eficaz para a doença rara de um paciente, a operadora do plano de saúde tem a obrigação de fornecer esse tratamento.

Medicamentos Fora do Rol da ANS

Em muitos casos, as doenças raras demandam medicamentos que não estão incluídos no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS. No entanto, conforme a Lei nº 13.767/2018, que trata das doenças raras, os planos de saúde são obrigados a cobrir medicamentos e tratamentos que não constam nesse rol, desde que sejam essenciais para o tratamento da doença rara e sejam prescritos por um médico especialista.

2.2. A Lei dos Medicamentos para Doenças Raras: Lei nº 13.767/2018

A Lei nº 13.767/2018 foi uma conquista significativa para pacientes com doenças raras no Brasil, pois obriga os planos de saúde a fornecer cobertura para tratamentos e medicamentos de alto custo que são utilizados no tratamento de doenças raras. O ponto crucial dessa legislação é que ela garante o fornecimento de medicamentos de alto custo, mesmo que não estejam listados no Rol de Procedimentos da ANS, sempre que houver indicação médica.

Cobertura de Tratamentos Inovadores

Além dos medicamentos já existentes, a lei também garante que os planos de saúde cubram tratamentos inovadores. Isso é especialmente importante para doenças raras, pois muitos tratamentos para essas condições são novos e não têm uma ampla aceitação. A Lei nº 13.767/2018 foi estabelecida para garantir que a inovação terapêutica também seja acessível aos pacientes com doenças raras, evitando que a falta de um medicamento ou terapia tradicional prejudique a vida do paciente.

Direito à Assistência Especializada

De acordo com a mesma lei, os planos de saúde também são obrigados a garantir assistência especializada para os pacientes com doenças raras, considerando a complexidade desses casos e a necessidade de um acompanhamento contínuo e especializado. Isso inclui a cobertura de consultas com médicos especialistas, além dos exames e terapias necessárias para o acompanhamento da condição do paciente.

2.3. O Sistema Único de Saúde (SUS) e as Doenças Raras

Embora os planos de saúde privados tenham obrigações legais em relação ao tratamento de doenças raras, o SUS desempenha um papel crucial no fornecimento de cuidados de saúde a pacientes com essas condições, especialmente para aqueles que não têm acesso a planos privados ou que não possuem recursos para cobrir tratamentos caros.

Rede de Atenção às Doenças Raras

Em 2014, o Ministério da Saúde estabeleceu a Rede de Atenção às Doenças Raras, com o objetivo de melhorar o diagnóstico e o tratamento dessas condições. Essa rede integra serviços de atenção primária, especializada e hospitalar, oferecendo tratamento multidisciplinar e acompanhamento contínuo para pacientes com doenças raras.

Além disso, o SUS fornece medicamentos de alto custo para pacientes com doenças raras, por meio de programas como a Farmácia de Alto Custo e a Incorporação de Tecnologias no SUS. Para isso, os pacientes devem se cadastrar nos programas estaduais ou federais, para ter acesso a medicamentos e tratamentos que não estão amplamente disponíveis.

Diagnóstico e Tratamento Especializado

O SUS também tem como obrigação fornecer o diagnóstico e tratamento especializado de doenças raras. Isso inclui exames e consultas com especialistas, além da oferta de tratamentos medicamentosos ou terapias para condições raras, sempre que disponíveis. Embora o SUS enfrente desafios, como a limitação de recursos e a escassez de medicamentos para doenças raras, ele ainda é a única opção para muitas pessoas que não têm acesso a planos de saúde privados.

Protocolos de Tratamento

Em casos de doenças raras que possuem protocolos terapêuticos estabelecidos, o SUS oferece uma linha de cuidados padrão, com recomendações sobre os medicamentos, terapias e tratamentos mais eficazes. Quando um tratamento inovador ou experimental é necessário, o paciente pode ser encaminhado para pesquisas clínicas ou para tratamentos em centros de referência, que têm autorização do SUS para fornecer tratamentos não convencionais.

3. Quando o Plano de Saúde Nega Tratamento para Doenças Raras: O Que Fazer?

A negativa de cobertura de tratamento para doenças raras por parte dos planos de saúde é uma situação cada vez mais comum, mas que gera grande impacto na vida dos pacientes e de suas famílias. Pacientes com doenças raras frequentemente enfrentam uma série de desafios no acesso ao diagnóstico e ao tratamento adequado. Quando um plano de saúde se recusa a cobrir um tratamento essencial, a situação se torna ainda mais complicada, exigindo que os pacientes conheçam seus direitos e saibam como proceder para garantir que suas necessidades sejam atendidas.

Neste contexto, entender as ações que podem ser tomadas em caso de negativa de cobertura por parte do plano de saúde é fundamental para que os pacientes possam lutar por seus direitos. A seguir, abordaremos as principais medidas que podem ser adotadas pelos pacientes e familiares para reverter essa situação.

3.1. Verificação da Negativa

O primeiro passo ao enfrentar a negativa de cobertura é entender o motivo da recusa. Isso deve ser feito por meio de uma análise detalhada da justificativa fornecida pelo plano de saúde. De acordo com a legislação brasileira, os planos de saúde são obrigados a fornecer uma explicação clara sobre os motivos da negativa, seja em relação a tratamentos, medicamentos ou procedimentos médicos.

Motivos Comuns de Negativa

Alguns motivos comuns para a negativa de cobertura de tratamentos para doenças raras incluem:

• Ausência de cobertura no Rol de Procedimentos da ANS: Embora a ANS tenha regulamentado a cobertura para muitas doenças raras, alguns tratamentos ainda podem não constar no rol de procedimentos.

• Custo elevado do tratamento: Muitos tratamentos para doenças raras são caros, especialmente medicamentos de alto custo, e o plano pode alegar que o tratamento não é coberto por questões econômicas.

• Classificação incorreta do tratamento: O plano pode classificar o tratamento como experimental, não essencial ou não comprovado, mesmo que o médico especialista recomende o tratamento.

• Falta de comprovação científica: O plano pode questionar a eficácia do tratamento, mesmo com a recomendação de um especialista.

3.2. Solicitar uma Segunda Opinião Médica

Caso o plano de saúde alegue que o tratamento não é necessário ou não é o mais indicado, uma opção viável é consultar um segundo médico especialista. Esse profissional pode fornecer um laudo médico adicional, com uma nova avaliação do caso e uma recomendação clara sobre a necessidade do tratamento. A segunda opinião pode ser especialmente importante se o plano de saúde alegar que o tratamento não é essencial ou adequado.

Se o médico indicar o tratamento como necessário, isso fortalecerá a argumentação na disputa contra a negativa do plano de saúde. Lembre-se de que a recomendação de um especialista em doenças raras tem grande peso na legislação brasileira e pode ser crucial para reverter a negativa.

3.3. Apresentação de Recurso Administrativo ao Plano de Saúde

Uma das formas mais diretas de contestar a negativa é entrar com um recurso administrativo junto à operadora do plano de saúde. De acordo com a Resolução Normativa nº 259/2011 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), os planos de saúde devem oferecer aos beneficiários a oportunidade de reconsideração ou recurso diante da recusa de um tratamento, procedimento ou medicamento.

Passos para Recorrer Administrativamente

1. Reunir toda a documentação necessária: Incluindo a negativa do plano, o laudo médico detalhado, os exames necessários, receitas e quaisquer outros documentos que possam comprovar a necessidade do tratamento.

2. Escrever uma carta de recurso: A carta deve ser formal e incluir informações como o motivo da negativa, a explicação do médico sobre a necessidade do tratamento e a legislação que garante a cobertura de tratamentos para doenças raras.

3. Protocolar o recurso no plano de saúde: Envie o recurso para o setor responsável pela análise das negativas dentro do plano de saúde. Guarde uma cópia do protocolo de recebimento como comprovante.

4. Aguardar o prazo de resposta: O plano de saúde tem um prazo de 30 dias para analisar e responder ao recurso administrativo. Caso o plano de saúde não dê uma resposta dentro desse prazo, o beneficiário tem o direito de recorrer judicialmente.

3.4. Reclamar à ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar)

Caso o recurso administrativo não seja resolvido favoravelmente, uma das opções é registrar uma reclamação na ANS, que regula o setor de planos de saúde no Brasil. A ANS tem a responsabilidade de garantir o cumprimento das normas estabelecidas pela legislação e pode intervir em casos de descumprimento das obrigações dos planos de saúde.

A reclamação à ANS pode ser feita de forma simples por meio do site da agência, e a ANS tem um prazo para analisar o caso e tomar as devidas providências. A agência pode atuar, por exemplo, obrigando a operadora do plano de saúde a fornecer o tratamento necessário, caso constate que a negativa está em desacordo com as normas legais e regulamentares.

3.5. Buscar Assistência Jurídica

Quando todas as tentativas administrativas se mostram infrutíferas, o paciente pode buscar assistência jurídica especializada para garantir que seus direitos sejam respeitados. A ação judicial pode ser a solução mais eficaz quando o plano de saúde se recusa de maneira indevida a cobrir o tratamento para doenças raras.

Como Funciona a Ação Judicial?

• Ação contra o plano de saúde: A ação judicial pode ser movida contra o plano de saúde com o objetivo de garantir a cobertura do tratamento necessário. Nesses casos, é importante que o paciente tenha um laudo médico especializado, que demonstre a necessidade do tratamento e a recomendação do médico para a doença rara.

• Pedido de liminar: Em situações urgentes, pode-se solicitar uma liminar (decisão provisória) para garantir o fornecimento do tratamento enquanto o processo judicial continua. Esse pedido é especialmente relevante quando o tratamento é vital e não pode ser adiado.

• Indenização por danos morais: Além da garantia de cobertura do tratamento, é possível solicitar uma indenização por danos morais, caso o paciente sofra prejuízos em decorrência da negativa do plano de saúde, como agravamento da saúde, sofrimento psicológico ou perda de oportunidades de tratamento adequado.

3.6. Defensoria Pública

Caso o paciente não tenha condições financeiras para arcar com os custos de uma ação judicial, ele pode buscar a Defensoria Pública, que oferece assistência jurídica gratuita para pessoas em situação de vulnerabilidade. A Defensoria Pública pode atuar em nome do paciente para garantir o tratamento necessário, ingressando com uma ação judicial ou representando o paciente na reclamação à ANS.

3.7. Acompanhamento e Monitoramento

Após a contestação da negativa de tratamento, é importante que o paciente e a família acompanhem de perto o processo. Isso inclui garantir que a ANS, a Defensoria Pública ou os advogados especializados estejam trabalhando ativamente para resolver o caso. Também é importante manter a documentação organizada, de modo que, caso seja necessário recorrer ao judiciário, todos os documentos necessários estejam prontos para garantir um processo ágil.

4. Conclusão

A negativa de tratamento para doenças raras por parte de planos de saúde é uma situação que pode gerar grande angústia e insegurança para os pacientes e suas famílias. No entanto, a legislação brasileira garante direitos específicos para esses pacientes, assegurando-lhes o acesso a tratamentos necessários, medicamentos e terapias inovadoras, independentemente da raridade da doença ou do custo do tratamento.

Quando o plano de saúde recusa a cobertura, o paciente pode recorrer administrativamente ou judicialmente, buscando garantir que seus direitos sejam respeitados. A legislação e as decisões judiciais favorecem o direito à saúde, principalmente no caso de doenças raras, onde o acesso ao tratamento adequado é essencial para a qualidade de vida e a sobrevivência do paciente.